José Dirceu: pacto pela reforma política

Coube à presidenta, Dilma Rousseff, dar concretude às inúmeras reivindicações, não raro contraditórias, que foram expostas nas manifestações das últimas semanas.
Ciente da importância da voz das ruas, Dilma propôs cinco pactos "em favor do Brasil", como ela chamou, que traduzem em ações objetivas os clamores por melhorias no transporte público, no sistema de Saúde, na Educação, na representatividade política e na responsabilidade fiscal.
Após reunião com governadores e prefeitos, Dilma apresentou, na segunda-feira, propostas como o avanço da reforma política, a alteração na lei para definir corrupção como crime hediondo, a contratação de médicos estrangeiros para trabalhar exclusivamente no SUS e a destinação de mais de R$ 50 bilhões em investimentos para mobilidade urbana. Com isso, a presidenta deu exemplos práticos de como os gritos pelo fim da corrupção e por mais saúde e transporte podem ser, sim, atendidos e transformados em realidade.
É claro que a oposição, partidária do "quanto pior, melhor", imediatamente começou a criar obstáculos -- mal disfarçados sob a aparência de restrições técnicas -- às propostas apresentadas. As maiores críticas couberam à sugestão de reforma política.
Ora, as manifestações deixaram evidente o descontentamento da população com nosso sistema político. O povo critica a forma de representação atual no Congresso, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras Municipais; desconfia do modelo de financiamento das campanhas eleitorais; acredita que seus representantes são, na verdade, representantes de poderosos setores econômicos.
Esse descrédito geral preocupa qualquer um que genuinamente se importe com a preservação da democracia em nosso país.
A reforma política, portanto, é mais que urgente. E, diga-se, há tempos o PT tem levantado essa bandeira e buscado colocar o debate na pauta nacional. Mas, até a ocorrência das manifestações, o debate estava interditado pela oposição e pelos grandes veículos de mídia, que se beneficiam de maneira indireta do atual sistema político-eleitoral.
Se a oposição novamente não colaborar para atendermos essa urgência, e preferir boicotar a proposta de Dilma apenas visando uma vantagem nas próximas eleições, vai acabar dando um tiro nos próprios pés -- pois só dá argumentos àqueles que, flertando com a volta do regime autoritário, veem a classe política como descolada da realidade do país e, por isso, desnecessária.
Assim, o desafio neste momento é mapear as legítimas reivindicações ouvidas nas ruas, afastar as ideias ofensivas à democracia e buscar o que é possível atender em benefício do Brasil e do fortalecimento democrático.
Cabe agora ao Congresso Nacional -- como fez com a aprovação dos 75% dos royalties do pré-sal para a Educação e 25% para a Saúde -- encaminhar, com o apoio e sob a pressão da sociedade civil, as tratativas para que esse grande pacto ganhe os devidos contornos legais.
O ideal é que esse importante passo da reforma política seja dado por meio de um plebiscito popular, o que depende de aprovação do Congresso Nacional. Mas a oposição, dando mais uma demonstração de como despreza a opinião dos brasileiros comuns, já se apressou em classificar essa possibilidade como "inviável".
A oposição não rejeita a reforma política apenas por causa da sugestão de que essa reforma poderia ser feita via plebiscito ou por meio de uma Constituinte específica. Há muito tempo o PT tenta fazer essa proposta avançar no Congresso, mas enfrenta a resistência dos mesmos que agora apresentam restrições "técnicas" ao pacto proposto pela presidenta Dilma.
Na Câmara dos Deputados, já há um relatório pronto, de autoria do deputado Henrique Fontana (PT-RS), com todos os pontos da reforma política. Mas o bloqueio da oposição impede que a Casa vote esse relatório.
Será que a oposição não ouviu os clamores por maior representação popular? A oposição vive em um mundo tão fantasioso que imagina que vai se beneficiar pelo clima de descontentamento revelado pelas manifestações? A oposição realmente acredita que o povo foi às ruas para receber, em troca, novas demonstrações de insensibilidade política e para ser usado no vale-tudo eleitoral?
A presidenta Dilma mostrou disposição ao diálogo e o esforço para atender as mudanças pedidas pela população tem todo apoio do PT. Um esforço que deve ser nacional e envolver todas as instituições, com destaque para o Congresso Nacional, fórum adequado para o debate sobre a reforma política.
O momento é de rara oportunidade para melhorar a forma como a democracia representativa se estrutura no Brasil. Não podemos deixar que interesses menores, eleitoralmente dirigidos, interditem novamente esse impulso das ruas. Reforma política já, plebiscito já!

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